3o Lugar: CONTO
Gilberto Garcia
da Silva
Praia Grande/SP
A MORTE DO POETA
Aos oito
anos escreveu um poema.
Meu cavalo se chama Alfredo.
Ele tem asas.
Quando vôo nele não tenho medo.
Quase
morreu de orgulho ao contemplar as três linhas. Aquilo
não existia; ele havia criado.
Seria para
sempre a coisa que mais lhe pertenceria no mundo todo.
Uma extensão de si mesmo, a maneira menos precária de tocar a beleza e a
eternidade.
Correu até
a cozinha. A mãe cuidava da louça e não quis
secar as mãos. Abaixou o rosto, franziu a testa e os lábios.
- Você não
tem cavalo – ela -
disse, depois de decifrar cada uma das letras.
Continuou
segurando a folha acima da cabeça, à espera de outro comentário.
- Vai
limpar o quintal - ela mandou já de volta aos
pratos e talheres.
Recolheu o
poema. Era manhã de domingo e fazia sol. Chutou
pedras e tampinhas de garrafa, pendurou-se num galho de árvore. Decidiu
caminhar até a praça. Durante o trajeto foi construindo prédios de algodão
colorido e mudando nuvens de lugar.
O pai
tomava cerveja com os amigos. Mostrou-lhe a obra – fruto - furto da sua
imaginação.
Enquanto
ele lia, os amigos despentearam o seu cabelo.
Perguntaram quantas meninas tinha namorado e
apertaram o seu braço para saber se estava musculoso. Riu sem graça e disse
palavras insignificantes. O pai devolveu a folha, ao
final de uma luta mais ou menos breve.
- Cavalo
não voa - retomou a conversa.
Virou as
costas.
- O quintal
já está limpo? - o grito alcançou-o do outro lado da rua.
Respondeu
com um levantar de ombros. Guardou o poema no bolso da bermuda e foi embora,
olhos baixos, passos rápidos. Juntou pedaços de papel, pontas de cigarro,
insetos mortos, miudezas perdidas e abandonadas. Fez uma fogueira com o lixo da
semana. Comeu maionese e carne assada, pudim de sobremesa. Viu televisão e
dormiu.
No dia
seguinte a mãe lavou a roupa da família enquanto, perto dali, ele decorava
nomes e datas.
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